quarta-feira, 3 de setembro de 2014

A alma dos diferentes  03/0/2014
"
Quem tem luz própria sempre incomoda quem está no escuro."
Marcio Kühne
"... AH, o diferente, esse ser especial!" escreveu Artur da Távola. "O diferente nunca é um chato. Mas é sempre confundido por pessoas menos sensíveis e avisadas. Supondo encontrar um chato onde está um diferente, talentos são rechaçados; vitórias, adiadas; esperanças, mortas. Um diferente medroso, este sim, acaba transformando-se num chato. Chato é um diferente que não vingou. Os diferentes muito inteligentes percebem porque os outros não os entendem. Diferente que se preza entende o porque de quem o agride. O diferente paga sempre o preço de estar – mesmo sem querer – alterando algo, ameaçando rebanhos, carneiros e pastores. O diferente suporta e digere a ira do irremediavelmente igual, a inveja do comum, o ódio do mediano. O diferente começa a sofrer cedo, já no primário, onde os demais, de mãos dadas, e até mesmo alguns adultos, por omissão, se unem para transformar o que é potencial em caricatura. O que é percepção aguçada em: "Puxa, fulano, como você é complicado". O que é o embrião de um estilo próprio em: "Você não está vendo como todo mundo faz?" Só os diferentes mais fortes do que o mundo se transformaram nos seus grandes modificadores. Diferente é o que vê mais longe do que o consenso. O que sente antes mesmo dos demais começarem a perceber. Diferente é o que se emociona enquanto todos em torno, agridem e gargalham. É o que estuda onde outros burram. Quer onde outros cansam. Espera de onde já não vem. Sonha entre realistas. Concretiza entre sonhadores. Cria onde o hábito otimiza. Fala de amor no meio da guerra. Os diferentes aí estão: enfermos, paralíticos, machucados, inteligentes em excesso, bons demais para aquele cargo, excepcionais, narigudos, barrigudos, joelhudos, de pé grande, de roupas erradas, cheios de espinhas, de mumunha ou de malícia. A alma dos diferentes é feita de uma luz além. Sua estrela tem moradas deslumbrantes que eles guardam para os pouco capazes de os sentir e entender. Nessas moradas estão tesouros da ternura humana. De que só os diferentes são capazes."

terça-feira, 21 de janeiro de 2014



Um chá de ternura
"O que faz doer à alma é viver das sobras do tempo, restos de carinho e retalhos de atenção." 
Marcio Kühne
É UMA avó que conta que, certo dia, sua filha lhe telefonou do Pronto-Socorro. Sua neta, Robin, de apenas seis anos, tinha caído de um brinquedo, no pátio da escola, e havia ferido gravemente a boca. A avó foi buscar as irmãs de Robin na escola e passou uma tarde agitada e muito tensa, cuidando das crianças, enquanto aguardava que a filha retornasse com a menina machucada. 
Quando finalmente chegaram, as irmãs menores de Robin correram para os braços da mãe. Robin entrou silenciosa na casa e foi se sentar na grande poltrona da sala de estar. O médico havia suturado a boca da menina com oito pontos internos e seis externos. O rosto estava inchado, a fisionomia estava modificada e os fios dos cabelos compridos estavam grudados com sangue seco. A garotinha parecia frágil e desamparada. A avó se aproximou dela com o máximo cuidado. Conhecia a neta, sempre tímida e reservada. 
– "Você deseja alguma coisa, querida?", perguntou. Os olhos da menina fitaram a avó firmemente e ela respondeu: 
– "Quero um abraço". 
Quando o coração está dilacerado, quando a alma está cheia de curativos para disfarçar as lesões afetivas, gostamos e precisamos que alguém nos conforte. E você? Já abraçou alguém hoje?